BLACKYVA COMENTA PROCESSO DIREÇÃO DO FILME DO ENTRANDO NA DANÇA QUEER

BLACKYVA COMENTA PROCESSO DIREÇÃO DO FILME DO ENTRANDO NA DANÇA QUEER

Depois de ter sido selecionada para a direção artística do Entrando na Dança Queer, Blackyva chega agora próxima de dois meses de trabalho com as 10 personalidades selecionadas na categoria performer. A obra visual, prevista para estrear no final de abril, já está sendo gravada e nos próximos dias deve seguir para a pós-produção. Com o fim da jornada de concepção da obra junto às performers iminente, Blackyva faz um retrospecto e destaca elementos importantes do processo de criação.

Blacky conta que no primeiro encontro, ao observar o olhar, o rosto e a expressividade corporal de cada uma delas identificou três perguntas que habitavam seus pensamentos: Qual é o rosto do futuro? Qual é o corpo do futuro? Qual é a cor do futuro? e ainda completa “apesar de já estar com um plano de condução pronto, foi necessário recuar para compreender o lugar de conforto de cada uma e suas subjetividades, de modo que o diálogo ocorresse de forma horizontal […] foi necessário ter um olhar voltado para a necessidade de cada uma durante os ensaios. A partir daí, fomos exercitando outros tipos de danças…”.

Com o objetivo de mostrar que a cultura ballroom não se define pela técnica, mas sobre ser e expressar suas verdades, The Face of Ball pretende mostrar que as habilidades inerentes ao Voguing significam muitas coisas para o corpo que está realizando o movimento. A diretora relata que trabalhou exercícios que dinamizaram questões que envolviam a percepção de movimentos ancestrais, a auto-defesa de si e do grupo, a sensualidade e a sexualidade.

“Fui aprendendo bastante com elas durante os nossos encontros. A Ballroom é um movimento político e de conscientização do poder de uma linguagem urgente e poderosa. De experiências de vida que não dão mais conta de viver de forma linear e medíocre desse modelo falido de sociedade, carregado de normas de como tem que ser e agir. E essas existências, organicamente, extrapassam essas barreiras do ser. Elas transpassam para outros lugares do existir, do estar, lugares que quebram com essa configuração de mundo. Instituindo um novo nome, um novo pronome, um outro pensar” (BLACKYVA)

O controle de imagem e das representações é essencial para a manutenção de algumas narrativas. É por meio do imaginário que as sociedades definem suas identidades e objetivos, definem seus inimigos, organizam seu passado, presente e futuro. Num Brasil onde a cultura não é parte fundamental das estruturas políticas e econômicas, pisar no lugar e não ser nenhuma outra é contar a própria história.

Ainda vivemos sob um período em que a beleza está sobre os moldes da maldição do embranquecimento, de um olhar eurocentrado, essa patologia que distorce nossas imagens e visão de mundo. Sobre essa questão, Blackyva conta que usou como base para o processo a psicóloga brasileira Cida Bento, que diz: ” É um pacto narcísico de uma branquitude onde eles só podem lidar com o próprio espelho, eles não podem ter dúvidas que só o que eles produzem é belo, não podem ter dúvidas que a estética deles é a qualidade do que é belo”.

Como uma obra visual, The Face of Ball é concebida sob a consciência ideológica que as imagens possuem. Blackyva comenta que o trabalho se cria a partir da percepção de um modo de estar no mundo da comunidade que vai, segundo ela: ” acontecendo e se fortalecendo sem desconsiderar o mundo fora dela, pelo contrário, ela vai movimentando a construção desse futuro-presente para que abrace todos os corpos, ela vai iniciando jornadas de autodescobertas”. A diretora destaca ainda a necessidade de se discutir o corpo fechado nestes processos de autodestruição, pois acredita que ” não é sobre morrer em meio a guerra como um ato revolucionário. É ter outros caminhos que não sejam a morte. É estarem vivíssimas para gozarem de plenitude, abundância e prosperidade. Tudo o que é delas por direito”.

Não é atoa que sejam poucas as representações imagéticas boas de pessoas pretas, trans e periféricas e que a representação imagética inferiorizando as mesmas sejam muito mais expressivas. Blackyva constrói The Face of Ball não apenas como um lugar imaginário, mas como um espaço concreto de auto descoberta e construção de um futuro-presente, uma urgência sustentada nas performatividades que ” já não tem mais essa disposição e nem tempo para sofrer querendo se encaixar em algo irreal. Eu quero junto delas contar uma história que nos celebre, que nos abrace, que possamos olhar e sentir orgulho de nossas trajetórias e de nós mesmas. Porque o audiovisual tem poder, então nada mais justo que esse poder seja nosso”, finaliza